sexta-feira, 29 de março de 2024

"Luk Dim Bun Gwan" with Grand Master William Moy.


 Eu já estava auxiliando o Painel por muitas horas, ansiosamente aguardando para ouvir o Grão-Mestre William Moy falar sobre 'Luk Dim Bun Gwan'. Acontece que quando era bem mais jovem, meu Mestre Julio Camacho teria me dito que, ao conversar com o Grão-Mestre William Moy em São Paulo certa vez, ele teria compartilhado que quando se tem uma consciência clara da linha do ombro ao praticar o 'Luk Dim Bun Gwan', você dificilmente precisaria olhar. Pois o bastão seguiria a linha naturalmente em direção ao do adversário. Aquela história me fascinou tanto pela minha pouca idade quanto pelo fato de que naqueles tempos não era permitido assistir à prática de 'Luk Dim Bun Gwan'. Então, imaginar o filho do Patriarca Moy Yat praticando sem precisar olhar o adversário era quase mágico. Num piscar de olhos, 22 anos se passaram e eu estava ali de pé, segurando o microfone para que o Grão-Mestre William, em pessoa, pudesse falar exatamente sobre o 'Luk Dim Bun Gwan'. Nestes momentos, eu fico muito emocionado com a vida, é algo quase mágico, e eu estava muito concentrado para não sorrir, pois era quase involuntário. Afinal, uma parte minha pensou: 'Será que ele faria a demonstração sem olhar para o adversário?'.

I had been assisting the Panel for many hours, eagerly anticipating Grand Master William Moy's discussion on 'Luk Dim Bun Gwan'. It so happened that when I was much younger, my Master Julio Camacho allegedly told me that during a conversation with Grand Master William Moy in São Paulo on a certain occasion, he shared that when you have a clear awareness of the shoulder line while practicing 'Luk Dim Bun Gwan', you hardly need to look. As the staff would naturally follow the line towards the opponent. That story fascinated me both because of my young age and the fact that in those days, it wasn't allowed to watch 'Luk Dim Bun Gwan' practice. So, imagining the son of Patriarch Moy Yat practicing without looking was almost magical. In the blink of an eye, 22 years had passed and there I was standing, holding the microphone so that Grand Master William himself could speak precisely about 'Luk Dim Bun Gwan'. In these moments, I become very emotional about life; it's almost magical, and I was very focused not to smile, as it was almost involuntary. After all, a part of me wondered - 'Would he demonstrate without looking to his oponnent?'

Naquele dia, saí do hotel com meu discípulo Daniel e o aluno do Mestre Felipe Soares às 6h da manhã para ajudar na montagem. Amo as manhãs de sábado e especialmente aquela, que tinha tudo para ser um grande dia, e eu simplesmente não imaginava que o Grão-Mestre William me pediria para ajudar na demonstração. Estava emocionado, parecia não haver motivo para isso, mas era algo que carregava no coração. Talvez por isso, quando ele disse - 'Pega o bastão' - segurei o bastão dele e não o outro. Assim, por uns 3 segundos, éramos nós dois, cada um segurando a ponta do mesmo bastão, com ele me olhando talvez tentando entender o que eu estava fazendo, até que ele disse - 'Não esse, o outro bastão'.

On that day, I left the hotel with my disciple Daniel and Master Felipe Soares's student at 6 a.m. to assist with the setup. I love Saturday mornings, especially that one, which had all the makings of a great day, and I simply didn't imagine that Grand Master William would ask me to help with the demonstration. I was moved, it seemed there was no reason for it, but it was something I carried in my heart. Perhaps that's why when he said - 'Pick up the pole' - I grabbed his staff and not the other. So, for about 3 seconds, it was just the two of us, each holding one end of the same staff, with him looking at me, perhaps trying to understand what I was doing, until he said - 'Not this one, the other pole'.

"Ok, você pode disparar" - disse ele. E eu dei o meu melhor disparo.
 Assim, você poderia me ver ali na demonstração.

"Okay, now, go ahead." he said. And I took my best shot. 
So, you could see me there in the demonstration.



Quando abrimos um "Mo Gun", devemos ter claro a razão de fazermos isso dentro do contexto em que estivermos, é o que eu acho. Se você perder de vista que seu trabalho é a salvaguarda do Sistema Ving Tsun, talvez você faça coisas pelo dinheiro, pelo poder que a posição de liderança proporciona (ainda que dentro de uma pequena "bolha" das pessoas do seu convívio), pode ser que você se permita não cumprir o que foi combinado seja com um único aluno ou com um grupo inteiro. Ou talvez, por inocência, você não dimensione a responsabilidade que esse ato exigirá de você. Da mesma maneira, acredito que conforme os anos vão passando para um profissional ou simplesmente alguém que conduz um trabalho nesse ramo, se perdermos de vista o encantamento e o colorido que as artes marciais nos proporcionaram quando começamos a jornada, nós perdemos as forças e desistimos. Você pode até dizer: "Ei, eu estou focando nisso agora, ou naquilo..." - Mas no fundo, você já não consegue mais priorizar. E como diz o adágio citado por Yamamoto Tsunetomo no livro "Hagakure" (Ed. Conrad, 2004) - "Quando seu coração pergunta, o que você responde?" - Por isso, momentos como esse com o Grão Mestre William Moy significam muito para mim. Existem aqueles objetivos iniciais de quando você começou, e cada vez que você passa por eles mais amadurecido, você se pergunta: "Eu cheguei lá?" - Naquele momento, por alguns singelos minutos, existe um Thiago de 18 anos em algum lugar aqui dentro que, 22 anos depois, não só presenciou a tão sonhada demonstração de bastão do Grão Mestre William, quanto participou com ele. Se isso não for o máximo para um artista marcial, não sei mais o que é. Eu nunca desisti.

When we open a 'Mo Gun', we must have clear the reason for doing so within the context in which we find ourselves, that's what I believe. If you lose sight that your job is to safeguard the Ving Tsun System, perhaps you may do things for money, for the power that the leadership position provides (even within a small 'bubble' of the people in your circle), you may allow yourself not to fulfill what was agreed upon with a single student or with an entire group. Or perhaps, out of innocence, you may not fully grasp the responsibility that this act will demand of you. Similarly, I believe that as the years go by for a professional or simply someone who conducts work in this field, if we lose sight of the enchantment and colour that martial arts provided us when we began the journey, we lose strength and give up. You might even say: 'Hey, I'm focusing on this now, or on that...' - But deep down, you can no longer prioritize. And as the saying goes, as quoted by Yamamoto Tsunetomo in the book 'Hagakure' (Ed. Conrad, 2004) - 'When your heart asks, what do you answer?' - That's why moments like these with Grand Master William Moy mean a lot to me. There are those initial objectives from when you started, and each time you pass through them more mature, you ask yourself: 'Have I made it?' - At that moment, for a few simple minutes, there is an 18-year-old Thiago somewhere inside who, 22 years later, not only witnessed the long-awaited demonstration of Grand Master William's staff, but also took part in it. If that isn't the ultimate for a martial artist, I don't know what is. I never gave up





A DISCIPLE OF MASTER JULIO CAMACHO
Master Thiago Pereira
Leader of  Moy Fat Lei Family
moyfatlei.myvt@gmail.com
@thiago_moy 




sábado, 23 de março de 2024

GM PETE PAJIL: SHARP LIKE A KNIFE


Eu não imaginava, mas estava prestes a vivenciar um momento muito especial com o Grão-Mestre Pete Pajil. Ele chegou dos EUA naquela sexta-feira em Brasília. Nos sentamos à mesa de um restaurante, cercados pelo incrível visual do Pontão do Lago Sul. O Grão-Mestre Pete parecia energizado desde sua chegada. Rapidamente, toda a atenção da mesa voltou-se para ele. Felizmente, eu estava do seu lado. Provocado pelo Mestre Quintela, ele começou a compartilhar sua maneira de ver a vida. Meu irmão Kung Fu, Roberto Viana, estava próximo, e eu achei por bem traduzir para ele, afinal, o que o Grão-Mestre estava dizendo era muito especial. E meu irmão de Kung Fu merecia ouvir.

I hadn't imagined, but I was about to experience a very special moment with Grandmaster Pete Pajil. He arrived from the USA that Friday in Brasília. We sat at a table in a restaurant, surrounded by the incredible view of Pontão do Lago Sul. Grandmaster Pete seemed energised since his arrival. Quickly, all attention at the table turned to him. Fortunately, I was by his side. Provoked by Master Quintela, he began to share his perspective on life. My Kung Fu brother, Roberto Viana, was nearby, and I thought it best to translate for him; after all, what the Grandmaster was saying was very special. And my Kung Fu brother deserved to hear it.

Aquele momento com o Si Baak Gung Pete, havia começado bem antes para mim. Tinha decidido chegar em Brasília na quinta-feira, dia 14/03, para poder ajudar na organização de todo o evento. Com isso, pude desfrutar de muita 'Vida Kung Fu' com meu Si Gung. Como mostra a foto acima, na qual estamos tomando café juntos. Além de mim, meus dois discípulos que me acompanharam também tiveram essas mesmas oportunidades. Si Gung comentou que muitas vezes, no aniversário, não consegue disponibilizar a atenção que uma determinada pessoa precisa, devido à grande quantidade de demandas. Então, é como se a pessoa recebesse apenas 30 segundos de atenção dele - '...Essa pessoa poderia estar conosco aqui nesse momento, vivenciando a 'Vida Kung Fu', porque aí sim eu poderia dar atenção como estou dando para você e seus discípulos...' - Teria dito Si Gung enquanto cruzávamos a cidade de carro.

That moment with Si Baak Gung Pete had started much earlier for me. I had decided to arrive in Brasília on Thursday, the 14th of March, to help with the organization of the whole event. With that, I was able to enjoy a lot of 'Kung Fu Life' with my Si Gung. As shown in the photo above, where we are having coffee together. In addition to me, my two disciples who accompanied me also had these same opportunities. Si Gung commented that often on birthdays, he can't give the attention that a particular person needs due to the high volume of demands. So, it's as if the person only receives 30 seconds of his attention - '...This person could be here with us at this moment, experiencing the 'Kung Fu Life', because then I could give attention as I am giving to you and your disciples...' - Si Gung would have said while we were crossing the city by car.

No aeroporto, enquanto aguardávamos os demais convidados internacionais chegarem, Si Baak Gung lembrou-se de mim e do meu Si Hing e voltou sua atenção para nós. Foram quase 30 minutos de uma visão muito especial sobre como manifestar seu Kung Fu de diferentes formas, bem ali no meio do aeroporto. Eu apenas não pude deixar de notar o quão afiado o Si Baak Gung parecia estar. Quando pediu que eu fizesse uma abordagem ao soco dele que vinha em minha direção, ele teria dito: "...Isso não existe em uma luta real. Não se faz isso..."- Então ele fez uma série de demonstrações sobre uma outra maneira mais amadurecida de fazê-lo. Em outra oportunidade, ele explicou que em uma luta, nós somos os últimos a nos movermos. "...Thiago, eu me mantenho conectado, não importa o quão adversa seja a situação. Eu não me movo primeiro, eu deixo a pessoa se mover. Você pode vê-lo 'carregando'..." - Então ele fez um movimento como se colocasse um dos pés à frente - "...Eu estou sempre em estado de guarda, estava dizendo a Terryann, eu estava na fila, mas estava pronto, como um felino prestes a atacar. Mas você não percebe, porque 'eu não carrego o movimento'(I DON'T LOAD)..."- Concluiu ele.

At the airport, while we were waiting for the other international guests to arrive, Si Baak Gung remembered me and my Si Hing and turned his attention to us. There were almost 30 minutes of a very special insight into how to manifest your Kung Fu in different ways, right there in the middle of the airport. I just couldn't help but notice how sharp Si Baak Gung seemed to be. When he asked me to approach a punch coming towards me, he would have said, "...That doesn't exist in a real fight. You don't do that..."-  Then he made a series of demonstrations about a more mature way to do it. On another occasion, he explained that in a fight, we are the last to move. "...Thiago, I stay connected, no matter how adverse the situation. I don't move first, I let the person move. You can see him 'load'..." - Then he made a move as if he put one foot forward - "...I'm always on guard, I was telling Terryann, I was in line, but I was ready, like a cat about to attack. But you don't notice because you cant see the movement..."


No restaurante do Pontão, Si Baak Gung comentava sobre suas aulas de Salsa: "...Em uma luta, eu me movo por último, mas na Salsa, eu preciso conduzir a dança. Você precisa se manter conectado e sentir a conexão com a outra pessoa, então quando você troca de par, a pessoa te puxa de volta..." - Em outro momento da conversa, ele teria dito - "...As pessoas estão inconscientes de que são inconscientes..." - Referindo-se à falta de capacidade das pessoas em assumir a responsabilidade por suas escolhas, ou mesmo em entender que elas existem.

At the Pontão restaurant, Si Baak Gung was talking about his Salsa classes: "...In a fight, I move last, but in Salsa, I need to lead the dance. You need to stay connected, and you feel the connection with the other person, so when you switch partners, the person pulls you back..." - At another point in the conversation, he would have said - "...People are unaware that they are unaware..." - Referring to people's lack of ability to take responsibility for their choices or even to understand that they exist.


De volta ao aeroporto, Si Baak Gung Pete teria comentado que prefere golpear na altura das costelas porque a maioria dos caras protege a cabeça e esquece dessa região - "...Thiago, a maioria da luta acontece sob o radar..." - Concluiu ele. Porém, ele cria uma série de condicionantes para que isso ocorra naturalmente. No dia seguinte, na mesa do almoço durante o intervalo do painel, ele respondeu uma pergunta minha da seguinte forma - "...Thiago, sabe porque homens criam laços com outros homens? Claro, temos esportes, exército, interesses em comum... Mas existe respeito. Nós sabemos, como homens, que em uma mesa como essa por mais que estejamos nos divertindo, existe uma linha que não se pode cruzar... "- Sua certeza era sentida em cada palavra que eu ouvia. Ele prosseguiu - "...Thiago, você consegue lutar?" - Perguntou ele a mim. Todos na mesa me olharam, estávamos em doze. Eu quis dar uma de "educado" e respondi - "Bom... Eu... Acho que sim..." - Ele me interrompeu com um gesto de mãos e me pediu - "...Thiago, agora pergunta para mim: 'Você consegue lutar?'.. Vamos lá! Me pergunta!.." - Disse ele fazendo um gesto para eu não perder tempo. Fiz a pergunta e ele respondeu em um tom diferente - "Sim." - Então ele me indagou se eu sabia por que ele era capaz de responder com certeza e eu não - "...Porque você não tem experiência suficiente, Thiago. Eu tenho..." - Ele sorriu e comentou - "...Thiago, eu tenho 70 anos de idade... Você pode acreditar nisso? Inacreditável! Mas eu não me movo como alguém de 70 anos de idade, as pessoas não respeitam um cidadão de terceira idade. Eu estava andando na rua e tinha esse cara com um cachorro sem coleira, então eu disse: 'Ei! Coloque a coleira em seu cachorro!'..."

Back at the airport, Si Baak Gung Pete would have commented that he prefers to strike at rib height because most guys protect their heads and forget about that area - "...Thiago, most of the fight happens under the radar..." - He concluded. However, he creates a series of conditions for that to occur naturally. The next day, at the lunch table during the panel break, he answered a question of mine as follows - "...Thiago, do you know why men bond with other men? Of course, we have sports, the army, common interests... But there's respect. We know, as men, that at a table like this, no matter how much fun we're having, there's a line that cannot be crossed... "- His certainty was felt in every word I heard. He continued - "...Thiago, can you fight?" - He asked me. Everyone at the table looked at me; there were twelve of us. I wanted to be "polite" and replied - "Well... I... I think so..." - He interrupted me with a hand gesture and asked me - "...Thiago, now ask me: 'Can you fight?'.. Come on! Ask me!.." - He said, gesturing for me not to waste time. I asked the question, and he responded in a different tone - "Yes." - Then he asked me if I knew why he could answer with certainty and I couldn't - "...Because you don't have enough experience, Thiago. I do..." - He smiled and commented - "...Thiago, I'm 70 years old... Can you believe it? Unbelievable! But I don't move like a 70-year-old; people don't respect a senior citizen. I was walking down the street, and there was this guy with an unleashed dog, so I said: 'Hey!  leash your dog!'..."

(Almoço com Grão Mestre Pete no intervalo do painel. ).

(Lunch with Grandmaster Pete during the panel break. ).

"...Então o cara começou a fazer uma dança... Nunca faça essa dança, eu estava em guarda, mas ele não podia ver. Não faça essa dança." - Disse ele e prosseguiu - "Ele então me perguntou: 'E quem é você?' Eu respondi: 'Sou o Si Fu Pete, coloca a coleira no seu cachorro...'" - Si Baak Gung Pete, desde o aeroporto, passando pelo almoço no Pontão e terminando nesse almoço no intervalo do Painel, nos alertou sobre a importância de estarmos conectados, não importa a situação, e mais do que isso: "...O adversário precisa sentir uma coisa que eu chamo de 'Oh Shit! Factor'..." - Disse ele bem sério - "...Quando você toca no seu adversário, ou quando você toca a mão do seu parceiro de dança, eles precisam pensar: 'Oh Shit!' por diferentes razões, porque eles sabem que você está conectado com eles..."

"...So the guy started doing a dance... Never do that dance, I was on guard, but he couldn't see. Don't do that dance." - He said and continued - "He then asked me: 'And who are you?' I replied: 'I'm Si Fu Pete, put a leash on your dog...'" - Si Baak Gung Pete, from the airport, through lunch at Pontão, and ending at this lunch during the panel break, warned us about the importance of being connected, no matter the situation, and more than that: "...The opponent needs to feel something I call the 'Oh Shit! Factor'..." - He said very seriously - "...When you touch your opponent, or when you touch your dance partner's hand, they need to think: 'Oh Shit!' for different reasons because they know you're connected with them..."

A DISCIPLE OF MASTER JULIO CAMACHO
Thiago Pereira "Moy Fat Lei"
moyfatlei.myvt@gmail.com
@thiago_moy