Quando meu discípulo Markus começou a dar seus passos em direção ao palco, ao ser anunciado para sua titulação como Mestre, tudo estava tão bem alinhado, tão cuidadosamente construído até aquele momento, e nossa compreensão do que representa um Ato Cerimonial havia sido tão enriquecida, que eu não precisava me preocupar com absolutamente nada além de apreciar cada passo e gesto que Markus dava ou fazia.
Tínhamos dado o nosso melhor nos anos anteriores. Havíamos, inclusive, promovido uma Cerimônia de Reafirmação Discipular de forma que Keith Markus pudesse ser devidamente apresentado aos ancestrais da nossa Linhagem. Markus também esteve comigo em Brasília mais de uma vez, e em São Paulo, onde teve a oportunidade de receber Provimento de Vida Kung Fu diretamente do Grão-Mestre Leo Imamura, meu Si Gung, além de vivenciar experiências marciais muito significativas.
Contudo, foi apenas de volta ao Méier que ele chorou, ao perceber que ainda havia muito a melhorar. Para ele, um sentimento estranho; para mim, nada mais natural do que tomar consciência de quanto ainda não sabemos — e da busca constante por aprimoramento e entendimento.
Aquele Ato Cerimonial teve pouco de protagonismo individual. Nem Markus foi a "estrela principal", tampouco eu. A cerimônia estava inserida em um contexto muito maior, que falava sobre a Linhagem, a organização da qual fazemos parte e o futuro comum de todos que, naquela noite, compartilhavam o mesmo propósito: a Salvaguarda.
Quanto a mim, além do orgulho de ser uma singela parte da moldura de um momento que inaugurava uma nova geração em nossa Linhagem na América Latina — reconhecida pelas Lideranças do Grande Clã Moy Yat Sang, pelo Presidente da International Moy Yat Ving Tsun Federation e pelo Comitê de Lideranças do Moy Yat Ving Tsun Safeguard Group —, guardei um espaço para uma brincadeira descompromissada e silenciosa comigo mesmo: - "O primeiro Mestre de Ving Tsun de Rocha Miranda ajuda a titular o primeiro Mestre de Ving Tsun de Paracambi." - Pensei comigo mesmo, achando graça, sozinho.
Tínhamos dado o nosso melhor nos anos anteriores. Havíamos, inclusive, promovido uma Cerimônia de Reafirmação Discipular de forma que Keith Markus pudesse ser devidamente apresentado aos ancestrais da nossa Linhagem. Markus também esteve comigo em Brasília mais de uma vez, e em São Paulo, onde teve a oportunidade de receber Provimento de Vida Kung Fu diretamente do Grão-Mestre Leo Imamura, meu Si Gung, além de vivenciar experiências marciais muito significativas.
Contudo, foi apenas de volta ao Méier que ele chorou, ao perceber que ainda havia muito a melhorar. Para ele, um sentimento estranho; para mim, nada mais natural do que tomar consciência de quanto ainda não sabemos — e da busca constante por aprimoramento e entendimento.
Aquele Ato Cerimonial teve pouco de protagonismo individual. Nem Markus foi a "estrela principal", tampouco eu. A cerimônia estava inserida em um contexto muito maior, que falava sobre a Linhagem, a organização da qual fazemos parte e o futuro comum de todos que, naquela noite, compartilhavam o mesmo propósito: a Salvaguarda.
Quanto a mim, além do orgulho de ser uma singela parte da moldura de um momento que inaugurava uma nova geração em nossa Linhagem na América Latina — reconhecida pelas Lideranças do Grande Clã Moy Yat Sang, pelo Presidente da International Moy Yat Ving Tsun Federation e pelo Comitê de Lideranças do Moy Yat Ving Tsun Safeguard Group —, guardei um espaço para uma brincadeira descompromissada e silenciosa comigo mesmo: - "O primeiro Mestre de Ving Tsun de Rocha Miranda ajuda a titular o primeiro Mestre de Ving Tsun de Paracambi." - Pensei comigo mesmo, achando graça, sozinho.
When my disciple Markus began to make his way towards the stage, having just been announced for his Mastership, everything felt so well-aligned — so carefully built up to that moment — and our understanding of what a Ceremonial Act truly represents had been so greatly enriched, that I found myself with nothing to worry about. All I had to do was simply appreciate each and every step and gesture that Markus took or made.
We had given our very best in the years leading up to that day. We had even held a Discipular Reaffirmation Ceremony so that Keith Markus could be properly introduced to the ancestors of our Lineage. Markus had also accompanied me to Brasília on more than one occasion, as well as to São Paulo, where he had the opportunity to receive Kung Fu Life Provision directly from Grandmaster Leo Imamura, my Si Gung, in addition to experiencing deeply meaningful martial moments.
However, it was only upon returning to Méier neighborhood that he cried, as he realised how much further he still had to go. For him, it was a strange and unexpected feeling; for me, it was nothing more than the natural awareness of how little we truly know — and of the ongoing journey toward refinement and understanding.
That Ceremonial Act was not about individual protagonism. Markus was not the “main figure”, nor was I. The ceremony was part of something far greater — a context that spoke of the Lineage, the organisation to which we belong, and the shared future of all those who, on that evening, were united by a common purpose: Safeguarding.
As for myself, beyond the pride of being a humble part of the frame that marked the beginning of a new generation within our Lineage in Latin America — recognised by the Leadership of the Grand Clan Moy Yat Sang, the President of the International Moy Yat Ving Tsun Federation, and the Leadership Committee of the Moy Yat Ving Tsun Safeguard Group — I reserved a quiet, playful moment just for myself: “The first Ving Tsun Master from Rocha Miranda¹ helps to title the first Ving Tsun Master from Paracambi²,” - I thought to myself, smiling in private amusement.
¹ - Rocha Miranda is a small neighbourhood from Rio where I was born.
² - Paracambi is a small city in the countryside of Rio where Markus was born.
¹ - Rocha Miranda is a small neighbourhood from Rio where I was born.
² - Paracambi is a small city in the countryside of Rio where Markus was born.
Apesar de toda a dedicação que meu Mestre Julio Camacho teve comigo no passado, por conta da minha imaturidade, eu não conseguia dimensionar o que estava acontecendo quando participei da minha própria titulação, em agosto de 2015 (foto acima). Não foi por irresponsabilidade, mas por uma ignorância inconsciente. Eu sorria, recebia abraços, mas não compreendia que aquele momento não dizia respeito a mim, mas sim a algo muito maior, que eu sequer conseguia imaginar.
O Mestre Quintela costuma repetir muito uma frase: "Por isso a importância da rede (de apoio)."
Acredito que ele seja a pessoa de quem mais ouvi essa afirmação, e, sempre que me lembro dessa importância, penso com a voz dele, como se estivesse dizendo aquilo exatamente naquele instante.
Devido à minha falta de entendimento sobre a posição que eu ocupava, sobre o que significava ser um “Mestre” no contexto em que fui titulado, e sobre o que é o Provimento de Vida Kung Fu segundo a visão do nosso Grande Clã, cometi muitos erros em meu trabalho. Não demorou para eu perceber que aquilo que eu entendia por dedicação, simplesmente não era suficiente. Lembro-me com clareza de uma noite qualquer em 2019, em que eu estava sentado, observando três discípulos praticando, com Markus acompanhando. Quando os quatro começaram a fazer Chi Sau entre si, pensei, com total lucidez: “O meu trabalho não está bom.” - Mas também me lembro do que Markus me contou uma vez: quase vinte anos antes, ainda nos seus primeiros anos como bombeiro, ele não conseguiu entrar em uma churrascaria — por vergonha, por insegurança, não sabia exatamente. Ele simplesmente ficou na porta e voltou para casa. Por isso, ao vê-lo falando em sua própria titulação, diante de mais de cem pessoas, com todas as luzes e atenções voltadas para ele, dizendo cada palavra com obstinação, senti-me feliz por ele nos ter dado essa oportunidade de chegar até ali — para fazermos um trabalho melhor.
E isso, como diria o Mestre Quintela, graças à rede de apoio.
Despite all the dedication my Master, Julio Camacho, had towards me in the past, due to my immaturity, I was unable to grasp the true significance of what was happening when I took part in my own Mastership ceremony, in August 2015 (photo above). It was not out of irresponsibility, but rather an unconscious ignorance. I smiled, received embraces, yet failed to comprehend that that moment was not about me — it was about something far greater, something I could not yet even imagine.
Master Quintela often repeats a particular phrase: “That’s why the support network is so important.”
I believe he is the person from whom I’ve heard this the most, and every time I reflect on the importance of that support, I hear his voice — as if he were saying it to me right then and there.
Due to my lack of understanding regarding the position I held, what it meant to be a "Master" within the context in which I had been recognised, and the true nature of Kung Fu Life Provision according to the vision of our Grand Clan, I made many mistakes in my work. It did not take long for me to realise that what I understood as dedication was simply not enough.
I clearly remember an ordinary evening in 2019, when I was seated, observing three disciples training, while Markus watched attentively. When the four of them began practising Chi Sau together, I had a moment of complete clarity: “My work is not good enough.”
But I also recall something Markus once shared with me: nearly twenty years earlier, during his early years as a firefighter, he was unable to enter a steakhouse — out of shyness, or perhaps insecurity. He had remained at the door, and then returned home. And so, seeing him speaking at his own Mastership ceremony, in front of more than a hundred people, under the lights and attention of the audience, articulating each word with determination, filled me with joy — for he had given us the opportunity to reach that moment, so that we might now do a better job. And that, as Master Quintela would say, is thanks to the support network.
Lá estava eu mais uma vez, de pé. Não era mais a minha titulação — era a do meu discípulo. E, mais uma vez, tenho a certeza, no meu coração, de que não sou capaz de dimensionar o que estava realmente acontecendo naquele momento. No entanto, acredito que o Grão-Mestre Leo Imamura tenha conseguido compreender. Afinal, por diversas vezes, ele me chamou a atenção — com paciência e sutileza — sobre como estava sendo conduzida a preparação do Markus naquele período. Sempre sem forçar, sem dizer diretamente o que queria, mas deixando a reflexão no ar. Hoje, penso que, quando eu dizia "Está tudo indo bem", na verdade eu nem chegava a entender a profundidade da pergunta.
Mas, independentemente da quantidade de trabalho que ainda precisa ser feito, acredito fortemente em algo que compartilho com meu discípulo, o Mestre Keith Markus: o sentimento claro de sermos apenas pequenas peças dentro de uma engrenagem muito maior — o Grande Clã. Contudo, não pretendemos ser qualquer peça. Queremos ser o melhor parafuso que pudermos ser. Aquele que dá firmeza, aquele que não se solta.
There I was once again, standing. It was no longer my Mastership ceremony — it was my disciple’s. And once again, I knew deep in my heart that I was unable to fully grasp the magnitude of what was truly happening in that moment.
However, I believe that Grandmaster Leo Imamura did understand. After all, on several occasions, he gently and patiently drew my attention to how Markus’s preparation was unfolding during that period. Always without pressure, never stating explicitly what he meant — but leaving space for reflection. Looking back, I realise that when I used to say, “Everything is going well,” I wasn’t even close to understanding the depth of his question.
Yet regardless of how much work still lies ahead, I hold firmly to a belief I share with my disciple, Master Keith Markus: a clear sense that we are merely small components within a much greater mechanism — the Grand Clan. Still, we do not intend to be just any component. We want to be the best screw we can possibly be — the one that holds firmly, that never comes loose.
Acho que o sentimento que eu tinha ao final daquela noite era de leveza. Eu tinha dado o meu melhor — com a ajuda de muitas pessoas — e meu discípulo conseguiu realizar um sonho, na presença da esposa, dos filhos e de amigos próximos. E eu... eu não estava feliz, nem triste, e tampouco esperando algo a partir daquele instante.
Hoje, só penso em me fortalecer cada vez mais como praticante de Ving Tsun, para ser capaz de me ajustar às demandas que ainda estão por vir. E, por mais que eu acredite ter alguma intuição sobre quais sejam, ao menos hoje eu já sei que, na verdade, não faço ideia. É como se o caminho fosse simplesmente cultivar o preparo — estar pronto para quando for necessário. Nem mais, nem menos do que pedirem de você. E isso, de certa forma, traz leveza.
I believe the feeling I had at the end of that evening was one of lightness. I had given my very best — with the help of many people — and my disciple had managed to realise a dream, in the presence of his wife, children, and close friends. And I… I wasn’t happy, nor sad, nor expecting anything from that moment onwards.
Today, my only focus is to continue strengthening myself as a Ving Tsun practitioner, so that I may be capable of adjusting to the demands that are still to come. And even though I believe I have some intuition as to what they might be, at least now I am aware that, in truth, I have no idea.
It feels as though the path is simply about cultivating readiness — being prepared for when you are needed. Nothing more, nothing less than what is asked of you. And that, in a way, brings a sense of lightness.
Today, my only focus is to continue strengthening myself as a Ving Tsun practitioner, so that I may be capable of adjusting to the demands that are still to come. And even though I believe I have some intuition as to what they might be, at least now I am aware that, in truth, I have no idea.
It feels as though the path is simply about cultivating readiness — being prepared for when you are needed. Nothing more, nothing less than what is asked of you. And that, in a way, brings a sense of lightness.
A DISCIPLE OF MASTER JULIO CAMACHO
Master Thiago Pereira
Leader of Moy Fat Lei Family
moyfatlei.myvt@gmail.com
@thiago_moy
moyfatlei.myvt@gmail.com
@thiago_moy