Você então podia nos ver ali, naquela manhã de sábado: eu e Diego (discípulo do Mestre Sênior Monnerat), que nos observava com atenção. Ao fundo, o Mestre Sênior Fabio Gomes, sempre muito atento ao que seu "Si Fu", o Grão-Mestre Leo Imamura, diz, validava com ele alguns conceitos. Na porta, meu discípulo Lucas assistia à minha tentativa de tutorização dentro do Domínio "Cham Kiu".
Bem antes disso, nos encontramos na padaria, e o Grão-Mestre Leo Imamura chegou trazendo importantes indagações sobre o trabalho que seria feito com Diego naquela manhã. Eu já havia feito trabalhado com ele também na noite de sexta-feira, mas o Grão-Mestre afirmava que, para aquela manhã, o que foi feito na noite anterior não era mais suficiente. Por isso, ele trouxe algumas perguntas bem diretas sobre o trabalho a ser realizado, e todos à mesa me observavam responder.
Geralmente, eu não fico nervoso em situações assim, mas naquela manhã em particular, eu estava. Não pelas pessoas olhando, mas porque, por alguma razão misteriosa, alguns meses antes, dentro do mesmo trabalho do "Cham Kiu", minha performance chegou a ser constrangedora. Em determinado momento naquela ocasião, o Grão-Mestre Leo Imamura chegou a pedir ao Mestre Monnerat que me ajudasse — parecia que algum "botão mental" havia sido desligado.
Por isso, sentado ali, minha ansiedade em mostrar que a situação não era mais a mesma era tamanha que eu não conseguia colocar em palavras o que queria dizer. Nessas horas, lembro também de uma fala da Professora Vanise para mim, orientando-me a "baixar a guarda e parar de lutar um pouco":
— "Você está lutando há muito tempo, tenta ser menos Yang um pouco, Thiago" — teria dito ela.
Recentemente, tive acesso a um vídeo espetacular do 7º dan de Aikido, Sihan Ricardo Leite, sobre a relação de irmandade dentro do mundo das artes marciais.
— "Você encontra o cara todo dia, e você eventualmente faz amizade até no trabalho. Fazer amizade não é o que caracteriza a prática do Aikido. Proporcionar uma harmonia, uma irmandade, que está baseada, fundamentada na experiência marcial. Nós nos tornamos irmãos quando a gente, junto, encontra o porquê de um movimento, sem força. Eu, que estou aplicando, encontro a via para explorar a força do meu parceiro, que está me atacando, e faço isso de tal forma que sai independente de mim ou dele. Porque nós veiculamos a arte na prática para além da nossa capacidade consciente. Ela se expressou na plenitude da nossa capacidade humana individual, em conjunto."
Mas talvez você se lembre do Lucas parado na porta do Instituto, na primeira imagem deste artigo. Como sempre escrevo aqui, entre erros e mais erros, e entre as dificuldades da Vida Kung Fu e da prática, o Lucas sempre tem acesso a tudo o que deseja nessa jornada.
Naquele mesmo dia, após o evento com o Mestre Bruno no Hotel Nikkey, retornamos ao Instituto Moy Yat e ficamos por uma hora e meia lá praticando. Lucas havia comido um pouco demais e provado uma cachaça chinesa oferecida pelo Mestre Bruno. Estava usando roupa social durante a prática e, mesmo com o ar-condicionado, suava bastante.
Em certo momento, Lucas parou, olhando para o nada, sentado sozinho na sala de convivência. Olhei para ele pela porta e perguntei se estava tudo bem. Ele pediu um tempo, porque a comida estava "voltando". Pouco tempo depois, levantou-se e continuou — agora praticando o "Biu Gwan". Parecia muito melhor do que da última vez que o vi. A cada tentativa, parecia mais preciso que a anterior, e não percebi mais nele o semblante de alguém que estava passando mal. Muito pelo contrário — ele parecia imerso.
Com uma compreensão sobre o manuseio do bastão mais profunda adquirida no Seminário do Nível 5, e com a atitude mental apropriada, aquele foi um dos nossos melhores dias. Talvez eu nem precisasse mais estar ali. Por isso, acredito que no futuro, Lucas poderá experimentar esse mesmo nível de conexão com seus irmãos Kung Fu, por meio de uma experiência marcial verdadeiramente imersiva. É nisso que quero acreditar.