Talvez seja o fato de eu poder abrir meu notebook pela manhã no Café 89 no bairro da Liberdade, talvez sejam os deliciosos pratos do restaurante coreano MOAH, ou quem sabe, o ventinho que bate quando você desce da Padaria Manhattan até o Instituto Moy Yat, caminhando pelas aprazíveis ruas do bairro do Brooklyn. Mas uma coisa é certa: depois de dois anos indo a São Paulo uma vez por mês, aprendi a amar a cidade, a rotina e as relações que desenvolvi lá.
Por outro lado, tenho forte em meu coração que, quando escolhemos ser um "Si Fu" (師父) , trata-se principalmente de uma questão de vocação. Essa vocação nos ajuda a tomar decisões quando necessário, pois podemos sempre nos apoiar nas obrigações dessa função social que decidimos ocupar. Então existe também um grande compromisso com a responsabilidade que essa função implica — "Um Si Fu não pode fazer tudo o que quer".
Tendo isso em mente, acredito que, por mais que tenha me encantado com um lugar ou com um estilo de vida, ao receber pessoas na minha Família Kung Fu que realmente queiram estar comigo para terem acesso ao Sistema Ving Tsun e que se disponibilizem para a "Vida Kung Fu", não posso simplesmente me mudar e deixar essas pessoas para trás.
Com isso, me recordo de uma fala do Grão-Mestre Leo Imamura para mim, ainda em outubro de 2010: "A sua vida não é mais só sua. Se você desistir, pense em como se sentiriam as pessoas que contam e acreditam em você. Sua vida não é mais só sua. Você não pode desistir".
Por isso, o meu trabalho seguirá no Rio de Janeiro, mas agora se expandirá também para São Paulo.
Por outro lado, tenho forte em meu coração que, quando escolhemos ser um "Si Fu" (師父) , trata-se principalmente de uma questão de vocação. Essa vocação nos ajuda a tomar decisões quando necessário, pois podemos sempre nos apoiar nas obrigações dessa função social que decidimos ocupar. Então existe também um grande compromisso com a responsabilidade que essa função implica — "Um Si Fu não pode fazer tudo o que quer".
Tendo isso em mente, acredito que, por mais que tenha me encantado com um lugar ou com um estilo de vida, ao receber pessoas na minha Família Kung Fu que realmente queiram estar comigo para terem acesso ao Sistema Ving Tsun e que se disponibilizem para a "Vida Kung Fu", não posso simplesmente me mudar e deixar essas pessoas para trás.
Com isso, me recordo de uma fala do Grão-Mestre Leo Imamura para mim, ainda em outubro de 2010: "A sua vida não é mais só sua. Se você desistir, pense em como se sentiriam as pessoas que contam e acreditam em você. Sua vida não é mais só sua. Você não pode desistir".
Por isso, o meu trabalho seguirá no Rio de Janeiro, mas agora se expandirá também para São Paulo.
Perhaps it’s the fact that I can open my laptop in the morning at Café 89 in the Liberdade district, perhaps it’s the delicious dishes at the Korean restaurant MOAH, or maybe it’s the breeze that blows as you walk from Manhattan bakery to the Moy Yat Institute, strolling through the pleasant streets of the Brooklyn neighbourhood. But one thing is certain: after two years of going to São Paulo once a month, I have come to love the city, the routine, and the relationships I have developed there.
On the other hand, I strongly believe that when we choose to be a "Si Fu" (師父), it is primarily a matter of vocation. This vocation helps us make decisions when necessary, as we can always rely on the duties that come with this social role we have chosen to occupy. There is also a great commitment to the responsibility that this role entails — "A Si Fu cannot do everything he wants."
With this in mind, I believe that, no matter how enchanted I may be with a place or lifestyle, when I welcome people into my Kung Fu Family who genuinely wish to be with me to access the Ving Tsun System and who are committed to the "Kung Fu Life", I cannot simply move away and leave these people behind.
With this in mind, I remember a statement from Grandmaster Leo Imamura to me, back in October 2010: "Your life is no longer just your own. If you give up, think about how the people who count on you and believe in you would feel. Your life is no longer just yours. You cannot give up."
Therefore, my work will continue in Rio de Janeiro, but now it will also expand to São Paulo.
Dois dias atrás, estava com o Grão-Mestre Leo Imamura no interior do estado de Goiás, conversando em um banco de madeira. O clima estava nublado, e não me recordo exatamente como, mas decidi falar sobre o quanto fiquei encantado com a cidade de Bangkok, que achei tão mágica e segura. "Segurança é uma percepção"- disse ele. Sabe, nessas horas você pode pensar em uma série de argumentos, mas eu preferi permanecer em silêncio e ouvi-lo. - "...Agora, me soa estranho um artista marcial querer se mudar por conta de segurança, por exemplo..."- Teria dito ele, fazendo uma pausa, e prosseguiu: "...É como dizer: 'Olha, eu cansei de lutar, viu? Não quero mais lutar...'"- Aquela analogia me pegou de surpresa. Permaneci calado, e ambos olhamos adiante, sem dizer nada. Porém, sabia que precisaria refletir sobre minhas recentes convicções.
De fato, esse projeto em São Paulo para 2025 só está sendo possível por conta de ter observado de perto a ética de trabalho do Grão-Mestre Leo. Pois, mesmo tendo se mudado para Brasília, ele viaja regularmente para São Paulo, onde passa em média 15 dias ininterruptos, dedicando talvez 95% de seu tempo aos membros do Grande Clã que desejam estar com ele, fazer aulas ou ter seus MPA's. Geralmente, ele já chega recebido no aeroporto e emenda com momentos de "Vida Kung Fu". O mesmo tende a acontecer em Brasília quando retorna. Além disso, seu traslado mensal entre as duas cidades, que ficam a pouco mais de uma hora de distância de avião, não honera em nada os membros do Grande Clã. Então, é como se ele se responsabilizasse integralmente pela sua decisão de se mudar.
Por isso, se, por um lado, "um Si Fu não pode fazer tudo o que quer", por outro, cabe a ele criar as condições para fazer aquilo que lhe é importante, desde que garanta o tempo necessário para cada discípulo individualmente. Essa dedicação sem precedentes me inspirou a dar esse passo, ainda que ele nunca tenha tocado nesse assunto comigo.
Two days ago, I was with Grandmaster Leo Imamura in the interior of the state of Goiás, sitting on a wooden bench. The weather was cloudy, and I don’t exactly remember how, but I decided to speak about how enchanted I was by the city of Bangkok, which I found so magical and safe. "Safety is a perception,"- he said. You know, in moments like these, you can think of a variety of arguments, but I chose to remain silent and listen to him.- "...Now, it sounds strange to me that a martial artist would want to move because of safety, for example..." - he would have said, pausing, and continued: "...It’s like saying: 'Look, I’m tired of fighting, you know? I don’t want to fight anymore...'"- That analogy took me by surprise. I stayed quiet, and we both looked ahead, not saying anything. However, I knew I would need to reflect on my recent convictions.
In fact, this project in São Paulo for 2025 is only possible because I have closely observed the work ethic of Grandmaster Leo. Even though he moved to Brasília, he regularly travels to São Paulo, where he spends an average of 15 uninterrupted days, dedicating perhaps 95% of his time to members of the Grand Clan who wish to be with him, take lessons, or have their MPAs. He is usually greeted at the airport and immediately transitions into moments of "Kung Fu Life". The same tends to happen in Brasília when he returns. Furthermore, his monthly commute between the two cities, which are just over an hour apart by plane, does not burden the members of the Grand Clan in any way. So, it’s as if he takes full responsibility for his decision to move.
Therefore, if, on the one hand, "a Si Fu cannot do everything he wants", on the other hand, it is up to him to create the conditions to do what is important to him, as long as he ensures the necessary time for each disciple individually. This unprecedented dedication inspired me to take this step, even though he never brought this matter up with me.
Então, em uma noite qualquer, eu, o Sensei de Aikido Ricardo Leite e o Grão-Mestre Leo Imamura estávamos na cozinha do Instituto Moy Yat. O Grão-Mestre Leo procurava fotos para montar uma apresentação que faria no dia seguinte para alunos do Grão-Mestre William Moy, sobre como se tornou esse reconhecido profissional. Depois de meses observando e perguntando sobre a rotina do Instituto, resolvi sugerir ao Si Gung se ele achava uma boa ideia eu iniciar um trabalho com minha Família em São Paulo, fazendo uso do Instituto. - "Isso você tem que falar com o Presidente, já falou com ele?" — indagou ele, achando graça.- "Aqui eu não decido nada, você tem que falar com o Presidente"- continuou sorrindo, enquanto procurava as fotos. Então, questionei se ele achava que haveria algum problema em fazer esse movimento.- "Por que problema?" — teria perguntado ele, me olhando. - "Não estou entendendo"- prosseguiu. Conversamos então e chegamos à conclusão de que não haveria problema nenhum.
Then, on an ordinary evening, I, Sensei Ricardo Leite of Aikido, and Grandmaster Leo Imamura were in the kitchen of the Moy Yat Institute. Grandmaster Leo was searching for photos to put together a presentation he would give the following day to students of Grandmaster William Moy, about how he became this recognised professional. After months of observing and asking about the Institute’s routine, I decided to suggest to Si Gung whether he thought it would be a good idea for me to start a project with my Family in São Paulo, using the Institute. - "You need to speak to the President about that, have you spoken to him?"- he asked, amused. - "I don’t make any decisions here, you need to speak to the President," - he continued, smiling, while searching for the photos. Then, I asked him if he thought there would be any problem with making this move. "What problem?" he would have asked, looking at me. "I don’t understand," he continued. We then discussed it and concluded that there would be no problem at all.
Graças à convivência com o Grão-Mestre Leo Imamura em diferentes cenários nos últimos dois anos, pude compreender melhor minha função como "Si Fu" (師父). Comentei com a Professora Vanise Almeida, em uma conversa recente por telefone, que fico muito feliz, por exemplo, com o fato de o Lucas estar em contato constante com alguém tão entendido do Programa Ving Tsun Experience como o Mestre Giarola, e com um dos maiores médicos de São Paulo e Si Fu, o Mestre Paulo Camiz. Disse a ela que essas pessoas podem promover situações ao Lucas, naturalmente, que eu não poderia. E isso só pode enriquecer seu processo.
Pude compreender que existe uma diferença entre "Família consanguínea", onde os pais precisam resolver tudo sozinhos (o que nem sempre acontece), e o "Pseudo-parentesco" [拟亲属], que é a referência em que a Família Kung Fu se apoia. Nela, cabe a mim favorecer o acesso dos discípulos ao Sistema da melhor maneira possível e prover a "Vida Kung Fu", mesmo que de forma indireta. Como sempre, não tenho o intuito de deixar minha marca. Como teria dito o Grão-Mestre Leo Imamura em um passeio de carro ontem: "Tudo o que você fizer, faça pensando na salvaguarda".
Porém, mesmo podendo contar com uma rede de apoio sólida, e no Rio de Janeiro com tutores já qualificados como o Mestrando Keith Markus, o Tutor Daniel Eustáquio e o Tutor José Carlos e Líderes de Família do Moy Yat Ving Tsun Safeguard Group, o exemplo que percebi do Grão-Mestre Leo Imamura é que um "Si Fu" (師父) não pode se cansar. E para isso, o Sistema Ving Tsun não deve ser um hobby, algo que se faz quando não há mais nada a fazer, ou um processo acessório ao título ou ao nome de alguém. O "Si Fu" (師父) tem responsabilidade com cada discípulo de garantir o acesso ao Sistema Ving Tsun.
Thanks to my time spent with Grandmaster Leo Imamura in various settings over the past two years, I have gained a better understanding of my role as "Si Fu" (師父). I mentioned to Professor Vanise Almeida in a recent phone conversation that I am very happy, for example, that Lucas is in constant contact with someone so knowledgeable about the Ving Tsun Experience Programme, like Master Giarola, and with one of the top doctors in São Paulo and Si Fu, Master Paulo Camiz. I told her that these people can provide Lucas with opportunities that I naturally could not. And this can only enrich his journey.
I came to realise that there is a difference between "biological family", where parents must handle everything on their own (which doesn’t always happen), and "pseudo-kinship" [拟亲属], which is the reference on which the Kung Fu Family relies. In this, it is my role to facilitate access for the disciples to the System in the best possible way and to provide the "Kung Fu Life", even if indirectly. As always, I do not intend to leave my personal mark. As Grandmaster Leo Imamura said during a car ride yesterday: "Everything you do, do it thinking of safeguarding."
However, even with a solid support network, and in Rio de Janeiro with tutors already qualified, such as Tutor Keith Markus, Tutor Daniel Eustáquio, Tutor José Carlos, and Family Leaders from the Moy Yat Ving Tsun Safeguard Group, the example I have learned from Grandmaster Leo Imamura is that a "Si Fu" (師父) must never tire. And for that reason, the Ving Tsun System must not be a hobby, something done when there is nothing else to do, or a process that is secondary to someone’s title or name. The "Si Fu" (師父) has the responsibility to ensure each disciple has access to the Ving Tsun System.
With the approval of Grandmaster Leo Imamura, my Si Gung, and that of the President of the Moy Yat Institute, Senior Master Paulo Camiz, the Moy Fat Lei Family will expand its work to São Paulo through the Moy Yat Institute starting in January 2025. Without leaving any disciple or practitioner behind, I will be present in both cities, knowing that all of this is possible because we have prepared the necessary conditions for it, whether through the preparation of members of my Family via the Safeguard Programme or through the support network promoted by the Moy Yat Ving Tsun Safeguard Group. However, more importantly, with the ongoing monitoring of Grandmaster Leo and Professor Vanise. This work makes all the difference, allowing us to take precise steps that align with the responsibilities I took on when I discovered what it means to be a "Si Fu" (師父) nine years ago.